
Havia uma moléstia entre a gente. No início pensei que pudéssemos remediar à conta gotas essas fases virais que surgiam em meias-estações. Sobretudo no verão um antigripal qualquer resolvia a tosse. Com o tempo, a moléstia veio a se tornar irremediável. O inverno, frio, cinza, parecia piorar esse mal estar. Instalada a infecção- crônica e incurável. Eu juro que tentava amenizar os sintomas com receitas caseiras, essas ancestrais, passadas de vó para neta. Água quente, chá de cidreira colhida na horta do meu pai. Estudei cura quântica como a descoberta inusitada para a nossa salvação. Palavras positivas e um mundo perfeito cocriado e nossa coexistência em plena harmonia. Às vezes os sintomas pareciam amenizar quando nos sentíamos individuais, fazendo nossas pequenas obrigações diárias. Por se tratar de moléstia sequer diagnosticada, ninguém percebia os espirros, olhos alérgicos. Noite a dentro e a febre insistia em encharcar nossos corpos sobre a cama. Quando me permitia a sua ausência podia ser qualquer coisa que não soluço. E você qualquer coisa que não náusea. A moléstia era uma coisa estranha. Ela prescindia presença física. Longe ela era apenas uma dor nas costas. Falta das asas.